Direitos do empregado sem carteira assinada

Por Dr. Clodoaldo Andrade Jr.
| 28 de julho de 2021

Um emprego com carteira assinada ainda é um sonho distante na vida de muitos brasileiros. Em pesquisa recente, divulgada pelo IBGE, estimou-se que cerca do 40% dos trabalhadores do país atuam na informalidade, seja trabalhando de forma autônoma, ou simplesmente laborando com a carteira não assinada pelo empregador.

Contudo, é importante frisar que o fato de não ter registro na CTPS (Carteira de Trabalho e Previdência Social), não significa, de forma alguma, não ter direitos. Na seara trabalhista um dos principais princípios reguladores é o chamado princípio da Primazia da Realidade, informando que para o direito do trabalho vale o que aconteceu na prática. 

Sendo assim, se estão presentes os requisitos abaixo, necessários para a caracterização do vínculo de emprego, a relação empregatícia estará estabelecida. 

  • A pessoalidade referindo-se ao fato de que somente o empregado poderá prestar o serviço para o qual foi contratado. 
  • A não eventualidade que significa que o a prestação de serviços deverá ser regular e contínua. 
  • A subordinação, determinando que o empregado deverá se reportar ao empregador e cumprir as regras e horários pré-determinados. 
  • E a onerosidade, que significa que o serviço prestado é remunerado. 

Portanto, se o empregado for capaz de comprovar que efetivamente prestou o serviço, ainda que sem registro na Carteira de Trabalho (CTPS), a Justiça do Trabalho conferirá a ele todos os direitos correspondentes.

Vale lembrar que para a comprovação do vínculo de emprego judicialmente podem ser usadas provas testemunhais, extratos bancários comprovando depósito de salários, crachá da empresa, mensagens através de redes sociais, e-mails, aplicativos, ou qualquer outro meio de prova. 

Por isso o objetivo deste texto é informar ao leitor quais são os direitos passíveis de reivindicação caso haja o trabalho sem carteira assinada de forma detalhada.

1. Caso o empregador se recuse a assinar a carteira

Nesta hipótese o empregado poderá ingressar primeiramente por via administrativa com uma reclamação formal perante a Superintendência Regional do Trabalho (Delegacia do Trabalho). Caso o empregador continue com a recusa, o empregado deverá ingressar judicialmente, requerendo a assinatura da sua carteira de trabalho (CTPS) de forma retroativa, ou seja: A partir do dia em que iniciou a relação laboral.

2. A obrigatoriedade da assinatura da Carteira de Trabalho

O Artigo 13 da CLT (Decreto-lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Diário Oficial do Brasil: secção 1, Rio de Janeiro, DF, ano 82, n.) determina que a Carteira de Trabalho e Previdência Social é obrigatória para o exercício de qualquer emprego, inclusive de natureza rural, ainda que em caráter temporário, e para o exercício por conta própria de atividade profissional remunerada. Portanto, em qualquer emprego há a obrigatoriedade de assinatura em carteira, inclusive no decorrer dos contratos de experiência.

Ressalte-se que com relação ao contrato de experiência existem regras específicas, como a limitação ao prazo máximo de noventa dias de duração. Além disso, só é possível uma prorrogação, caso a tratativa para o contrato de experiência tenha sido feita em período menor, nos termos do Artigo 445 da Consolidação das Leis do Trabalho. 

O registro em Carteira de Trabalho durante o período de experiência é obrigatório. Caso haja a demissão antes de findar o período de experiência o empregado fará jus a todos os direitos (Saldo de salário, 13º salário proporcional ao tempo de trabalhado, Férias + 1/3 proporcional ao tempo trabalhado e Levantamento do FGTS) caso a dispensa seja sem justa causa o empregado também terá direito a multa de 40% do Fundo de Garantia.

Outra dúvida comum diz respeito a contratação feita por particular ou por profissional liberal, na qual o empregado presta serviços para uma pessoa e não especificamente para uma empresa. Nesta hipótese as regras são as mesmas. O registro do empregado é uma obrigação que deverá ser cumprida pelo profissional liberal ou pelo contratante particular.

Não obstante, cabe ressaltar que desde setembro de 2019 a Carteira de Trabalho Digital poderá substituir a carteira física, facilitando ainda mais o registro.  Para o trabalhador, basta informar o número do CPF no momento da contratação. Para o empregador, as informações prestadas no e-Social substituem as anotações antes realizadas no documento físico, de forma simples e rápida.

Como vimos, é direito indiscutível do empregado a obtenção do imediato registro em carteira, seja de forma física ou digital. E caso o empregador não faça o registro, o empregado poderá pleitear a rescisão indireta do contrato de trabalho, fazendo jus a todos os direitos trabalhistas correspondentes ao período.

3. Direitos do trabalhador sem carteira assinada

Com o ingresso de ação judicial e o consequente reconhecimento do vínculo de emprego, o trabalhador passará a ter garantidos todos os direitos trabalhistas que teria se o contrato de trabalho estivesse formalizado de forma retroativa – contabilizando os valores a partir da data real do início da relação laboral -, são eles:

  • Férias acrescidas de 1/3;
  • 13º salário;
  • Aviso-prévio indenizado;
  • Computo de horas extras (mediante comprovação);
  • Adicional noturno (mediante comprovação);
  • Indenização do FGTS;
  • Multa de 40% do FGTS em caso de demissão sem justa causa;
  • Seguro-desemprego;
  • Contagem do seu tempo de serviço para fins de aposentadoria;
  • Vale-transporte;
  • Adicional de insalubridade/periculosidade (mediante comprovação);
  • Piso salarial.

Além de todos os demais direitos afetos ao vínculo formalizado, e os direitos que eventualmente estiverem previstos nas normas coletivas do Sindicato da categoria profissional correspondente.

Vale lembrar que as mesmas regras se aplicam aos casos em que o trabalhador possui registro em carteira, mas em condições diversas ao que acontece na realidade, como por exemplo com um valor menor de salário, ou carga horária reduzida. Nesta hipótese após o ingresso por via judicial, diante da comprovação das condições do vínculo empregatício, o valor de todos os direitos será recalculado e majorado  levando-se em conta a realidade fática e de forma retroativa.

4. Penalidades

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em seu artigo 47,  prevê que deverá haver a assinatura da carteira de trabalho no prazo de cinco dias subsequentes a sua apresentação pelo trabalhador. Na informação sobre o registro deverão constar todas as indicações sobre o contrato de trabalho como: data de admissão, valor do salário, horas semanais de jornada, prazo do contrato, dados do empregador e eventuais condições especiais.

Caso o empregador não proceda o registro em carteira, irá incorrer na pena de multa com valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) por cada empregado não registrado, sendo a multa dobrada em caso de reincidência. Para as microempresas e empresas de pequeno porte, o valor-base é reduzido para R$ 800,00 (oitocentos reais).

Ressalte-se que a jurisprudência também tem entendido que a retenção da carteira de trabalho sem motivo justo, nos casos em que o empregador a recolhe para proceder o registro e não a devolve ao trabalhador dentro do prazo estabelecido, poderá ser causa de indenização por danos morais.

Ademais, a ausência de registro em carteira constitui fraude contra a legislação trabalhista por parte do empregador, ensejando as sanções correspondentes.

5. Prazo para a ação

Muitas vezes, por medo de perder o emprego, o trabalhador deixa de insistir pelo registro durante o curso da relação laboral. 

No entanto, é muito importante que findo o contrato, seja por demissão ou outro motivo, o empregado se atente para o prazo prescricional inerente as ações na justiça do trabalho. Neste caso, o prazo para ingressar com a ação requerendo o registro em carteira é de até 2 (dois) anos após o término do contrato de trabalho, podendo cobrar os direitos relativos aos últimos 5 (cinco) anos contados da data da entrada do processo na justiça. 

A carteira assinada é um direito do trabalhador concedendo uma série de benefícios durante o vínculo empregatício e até mesmo em casos de afastamento do trabalho diante de eventual necessidade de recorrer aos auxílios da previdência social. Em contrapartida também é vantajoso para o empregador, pois o contrato de trabalho formalizado é capaz de ensejar o cumprimento correto das cláusulas avençadas e ainda evitar futuras demandas e penalidades perante a justiça do trabalho.

Ademais, nos dias de hoje é notória a busca dos consumidores e investidores por empresas socialmente responsáveis, o que inclui um bom ambiente laboral pautado pelo respeito as regras trabalhistas. Como pudemos ver, a CTPS assinada, com o cumprimento das leis trabalhistas é um direito do empregado, um dever do empregador e algo de extrema relevância para a sociedade em geral.

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